segunda-feira, 12 de outubro de 2009

"You didn't get me down, Ray."



Rosto inexpressivo. Olhos vazios fitando um ponto indefinido. Nada parecia abalá-lo.

Nem mesmo um direto de esquerda ou um gancho bem aplicado. Os golpes se sucediam rapidamente, sua cabeça pendendo para o lado a cada nova pancada. O supercílio já aberto escorre sangue, os olhos têm marcas arroxeadas. O corpo repousa sobre as cordas, buscando apoio, sem ceder.

O gongo soa.

Ele caminha vagarosamente para seu corner, alheio ao técnico que lhe oferece a toalha branca. Não há sentido em desistir. A luta ainda não terminou. A vitória não é uma possibilidade. Entretanto, a derrota é merecida. É apenas a consequência de tudo, o ato final de um longo filme. Um sofrimento necessário, com um quê de auto-flagelamento. O velho também não insiste. O resto de sua equipe se afasta.

E tem sido assim, desde os rounds anteriores. Os amigos se afastam, ao vê-lo tomado por tal impulso auto-destrutivo. E é exatamente esse o motivo pelo qual ele volta ao centro do ringue a cada novo chamado do juíz. Porque não há vida lá fora. Amigos esperando para consolá-lo pela derrota? Não. Eles o julgam fraco, patético, e o evitam quando podem. Há muito mais vida e sentido aqui, sobre a lona. Pelo menos há algo para sentir, para fazê-lo se sentir real, mesmo que sejam apenas socos certeiros fustigando-lhe o rosto já em frangalhos.

A moça com a placa que indica um novo round passa encarando-o com asco. O mesmo olhar dos amigos nos últimos tempos. Ninguém consegue entendê-lo. Ninguém vê que seu coração está mais destruído que seu rosto, que não há supercílio aberto, boca rasgada ou dentes caídos que possam equivaler a essa dor. E, portanto, não há motivo para deixar o ringue. Ali, a dor é menor.




You don't understand. I coulda had class. I coulda been a contender.
I coulda been somebody, instead of a bum, which is what I am.
Let's face it. It was you, Charley. 

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